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Um Personagem Mal, faz mal?

Eventualmente um ou outro desavisado me convida para aplicar uma Oficina sobre Teatro com um grupo espírita. Além de oportunidade única de compartilhar experiências, inevitavelmente aprendo mais que “ensino”. Enquanto falo, indicando procedimentos e contando vivências, organizo meu pensamento sobre questões incomuns.

Em uma destas oportunidades fizeram-me uma pergunta das mais curiosas. Enquanto eu apresentava a ideia de que a interpretação de um personagem deixa marcas no ator ou atriz que o interpreta, uma simpática jovem senhora me questionou:


__ Fazer um personagem mal ou bom: Faz mal? Ou faz bem?


Durante os dois segundos que sucederam à pergunta, naquele período em que você tem que escolher entre ir embora ou pedir para trocar a pergunta por uma mais fácil, tomei coragem de me aventurar em uma resposta improvisada mais ou menos assim:


__ Quem é o personagem? É comum quando começamos a “fazer teatro” entender que o persongem é algo raso e compartimentado: O juiz, a freira, o obsediado, o obsessor. Na verdade o personagem é um indivíduo. Nós somos personagens. Então o personagem é um juiz que tem uma família, um modo de ver a vida, um traço de carater: é um indivíduo.

Ao se relacionar com os indivíduos vai descobrir que cada um tem o lado bom e o lado ruim (e as coisas não são assim tao bem separadas).

Vai descobrir traços de caráter que no relacionamento social se tornam complexos ou não.

Ao pensar em interpretar um personagem bom ou ruim a primeira coisa a ser feita é desconstruir esse conceito de que é bom ou ruim. O personagem simplesmente é.

Uma serie de atitudes. Uma serie de comportamentos que voce percebe na forma como ele fala, o que falam dele, de como ele se relaciona com os outros personagens. Nós somos assim.

Entao interpretar um personagem é a oportunidade que eu tenho de verificar em que ele se parece comigo, o que não se parece comigo, o que eu posso um dia ser ou o que eu já fui.

Lidar com um personagem por exemplo que é o vilão do espetáculo, que tem toda a carga onde as coisas complicadas acontecem por ele é uma oportunidade de verificar em que se parece comigo, o que pode ser associado a atitudes que tenho na minha vida, que talvez ele tenha atitudes que eu ja venci, coisas que parecem com o que eu ja fui, coisas que tenho de cuidar para nao ser um dia.

Faz bem ou faz mal?

Nao sei responder tao simplesmente, mas se você tiver lucidez na abordagem naquilo que voce faz, reflexão franca e sincera com o que tem a ver com você, acho que so pode te fazer bem.

Se voce tem essa atitude e abordagem na interpretação de um personagem, com certeza provocará uma reflexão oxigenada de como pode ser diferente em suas próprias atitudes. Pode ser que esse gesto provoque em você mesmo, reforma de comportamento.


Assim de improviso, até gostei de minha resposta, mas fiquei com a intuição que há muito mais a ser descoberto sobre esta questão.



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